O mundial de 2006 terminou em beleza: um conjunto de jogos de medíocre qualidade, que não entusiasmou ninguém, além dos «fanáticos» de cada país, uma exibição de indisciplina e agressividade gratuita, protagonizada por duas selecções de países da Europa civilizada (Portugal-Holanda) e a encerrar, com chave de ouro, a famosa cabeçada de Zidane, que se desdobrou em subtis e inconclusivas averiguações e inquéritos.
A nossa Liga, encerrou a época passada com o folhetim da falência do Sporting – um aviso à navegação sobre a saúde financeira de muitos clubes, que todos fingem ignorar -, colocada em banho-maria de negócios imobiliá-
rios, e começa também em beleza: na base, as claques já inauguraram a época com o vandalismo habitual, na cúpula os dirigentes entretêm o povão com apaixonantes telenovelas: o «caso Mateus» e as subtis nuances entre direito público e «direito desportivo», de ética mais elevada: as revelações sobre o processo designado «Apito Dourado», oportunamente deslocado das neblinas de negócios opacos e chorudos para a descoberta da pedra filosofal, no caso, designada pela verdade do jogo. Nota curiosa, o presidente da FPF, Gilberto Madail, tornou-se invisível e mudo: nada tem a declarar sobre a barrela.
A recente troca de galhardetes entre Filipe Vieira e Valentim Loureiro, transmitida em directo pelas televisões, é um bom indicador do nível dos actores. O futebol português contínua a girar, em roda livre, sem que ninguém saiba onde termina o fundo do abismo, mas curiosamente os seus principais promotores – políticos, governantes e autarcas – fingem que não percebem.
Esta feliz conjugação de acontecimentos é um bom indicador da grande utilidade que teve o Congresso Nacional do Desporto (leia-se do futebol), realizado recentemente pelo Governo.
Cito: Com o Congresso do Desporto, o Governo quis "introduzir um modelo de desenvolvimento desportivo aberto e sustentável", que aposte numa "gestão participada" e na qual a iniciativa das autarquias, do movimento associativo e das entidades públicas e privadas seja "o motor da mudança". Se conseguiu... só o futuro o dirá!
Este Congresso terá servido ainda para o legislador aferir das condições actuais do desporto nacional, com o intuito claro de "preparar uma nova Lei de Bases do Sistema Desportivo".
É óbvio que esta linguagem em «politiquês» necessita de ser traduzida: o objectivo, não confessado, do Governo com estas duas iniciativas é simples e prosaico: como as receitas geradas pelo Euromilhões disparam em flecha, trata-se de sacar dinheiro à Santa Casa para continuar a alimentar as taras do futebol.
É uma original e moderna forma de redistribuição: tirar aos necessitados (quantos milhares de idosos, crianças, famílias em situação de grande carência!?) para dar aos ociosos. Que um Governo dito socialista conceba semelhante aberração é digno de ficar na história.
Diversos comentadores referem o óbvio de tudo isto: o planeta do futebol é cada vez mais um universo surrealista, generosamente sustentado pela complacência dos poderes públicos (Governo e Autarquias) e da sociedade em geral, onde um punhado de «artistas» consegue viver faustosamente. Como já disse Vasco Pulido Valente, noutras circunstâncias, pedir aos interessados que regenerem o futebol é o mesmo que pedir às prostitutas que reformem o bordel.
O futebol não é o sector mais corrupto do país – ainda não chegamos ao Brasil – mas a corrupção no futebol é, talvez, o factor que mais perverte os valores sociais, pela degradação e laxismo e que difunde entre amplas camadas da população: quer nos estádios, quer nas relações interpessoais do quotidiano, os adeptos aceitam as sucessivas transgressões, golpes baixos e ilegalidades de jogadores, treinadores, árbitros e dirigentes, desde que daí resulte benefício para o clube da sua simpatia. Esta simpatia e condescendên
cia pela violação da legalidade difunde uma subcultura em que os fins justificam os meios e transforma o transgressor em herói.
A subcultura do futebol em Portugal faz lembrar a subcultura da favela latino-americana: a transgressão em clima de brandos costumes.
A mercantilização de diversas modalidades desportivas, não trouxe qualquer benefício ao Desporto e adicionou-lhe inúmeros malefícios e perversões. Longe de contribuir para que a prática do Desporto se alargasse a amplas camadas da população (esta miragem só existe no programa do Governo para o sector) e para o fortalecimento das colectividades e associações populares, criou legiões de adeptos consumidores de bancada e de sofá, alienados em consumir vedetas desportivas, produtos fetiches e vitórias a qualquer preço.
Aquilo que é vendido aos adeptos das diversas modalidades desportivas não passa de uma deturpação grosseira de qualquer prática desportiva: negócios pouco transparentes, que movimentam milhões, manipulando as diversas modalidades desportivas transformadas em mercadoria de consumo de massas.
Os valores tradicionalmente associados ao Desporto, que o barão de Coubertin tentou ressuscitar, foram metidos na gaveta e substituídos por mercadorias de consumo: o próprio «atleta» praticante é valorizado e transaccionado como mercadoria, entre clubes ou marcas de qualquer multi-
nacional.
Esta subversão do Desporto só foi possível com a conivência e o estimulo dos poderes públicos, quer se trate de regimes democráticos ou de regimes ditatoriais, que procuram na popularidade das mesmas um suplemento de popularidade para as suas políticas.
A escolha das cidades candidatas às várias Olimpíadas é um negócio de milhões, gerido pelas respectivas instituições internacionais – elas próprias transformadas em empresas multinacionais, que nenhum pais ou organismo internacional controla.
A Educação e o Desporto situam-se na esfera dos sectores sociais que contribuem, indirectamente, para melhorar e elevar a qualidade e a produtividade da produção nacional, mas no que se refere ao futebol temos uma actividade improdutiva e parasitária que vive à conta dos recursos públicos: como circo é demasiado caro!
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