Quarta-feira, 29 de Setembro de 2004

Maria A. Ribeiro - Ainda o Ano Lectivo

Tem sido com enorme espanto que tenho assistido a todos os debates e conversas a propósito do início do ano lectivo - em concreto, a colocação de professores.
Não me revejo na maioria dos comentários que têm sido feitos. Devo, concerteza estar errada, mas não consigo pensar de forma diferente.
Existem, na minha opinião, dois pontos fundamentais nesta questão: 1ª Houve manifesta incompentência da equipa do Ministério da Educação; 2ª O que é necessário fazer para resolver em definitivo a questão da colocação de professores.
Não consigo concordar, de todo, que este atraso na colocação dos professores põe em causa o ano lectivo. Penso mesmo, que ao enfatizarmos esta questão estamos a prestar um péssimo serviço aos nossos estudantes. Senão vejamos: ao longo que toda a nossa vida,nomedamente profissional, deparamos com situações, em que por erro ou outra razão, mesmo que não da nossa responsabilidade, teremos de "correr atrás do prejuízo". Estas situações não são resolvidas com demagogias e muito menos com politiquices. São resolvidas com honestidade, esforço, dedicação e competência.
Tenho um filho no 8º ano, que, por frequentar um colégio particular, está em aulas desde 20 de Setembro, mas quem começar agora, não chega concerteza atrasado. Acresce ainda que a reforma curricular veio diminuir significativamente o número de horas lectivas da maior parte das matérias. Não me venham dizer que uma aula por semana de história ou geografia não é recuperável. Só não o é se alunos e professores o não quiserem! O discurso catastrófico que tem sido feito só contribuiu para que não o queiram.
Sempre frequentei escolas públicas, com péssimas condições ao nível de instalações, ao ponto de não haver aulas quando chovia, e nem por isso, deixamos matéria por estudar. Os meus pais e professores (felizmente na sua meioria competentes) sempre me ensinaram a vencer as dificuldades e a não baixar os braços. Entrei na Universidade com média de 19 e não fui a única de entre os meus colegas, até porque sou uma pessoa perfeitamente dentro da norma, a nível intelectual.
Ontem ouvi dois comentários que me arrepiaram.
Num programa da SIC Notícias, esteve presente um jovem estudante (penso que de 12º) com o discurso mais demagógico possível e revelou total incapacidade para responder às perguntas da jornalista, pois trazia uma discurso preparado sobre assuntos que não os que estavam em dicussão (como sejam as aulas de 90 minutos).
Num café, ouvi o seguinte comentário de estudantes do 12º ano: "Esta Ministra não pode demitir-se, porque com ela no Governo, os exames do 12º ano vão ser fáceis. Ela não pode arriscar a que chumbe muita gente, senão aí crucificam-na." "Estamos cheias de sorte, mais férias e este ano vai ser mais fácil".
Isto é, no mínimo deprimente.
Não podemos, na minha opinião, deixar impune a incompetência da equipa do Ministério, pois seria um péssimo exemplo, para os nossos jovens. E não venham atirar as responsabilidades para cima da COMPTA, porque é tão incompetente o que realiza mal uma tarefa como aquele que paga a um fornecedor externo incompetente.
Maria A. Ribeiro
publicado por quadratura do círculo às 12:40
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Fernanda Valente - Sobre Finanças

Ainda sobre o discurso do Sr. Ministro das Finanças sobre o status quo das nossas finanças, que espelha os tempos de austeridade que se avizinham, dirigido principalmente às classes média e média/baixa, prepara-lhes o espírito para o seu papel na sociedade de principais pagadores, utilizando o subterfúgio do utilizador/beneficiário de serviços disponibilizados pelo Estado, serviços esses obsoletos, que nunca foram objecto de reformas profundas seguindo os parâmetros dos providenciados pelos dos estados membros de uma comunidade à qual pertencemos.
Somos assim os principais pagadores pelas sucessivas políticas de gestão de recurso ministradas pelos vários governos desde o 25 de Abril - com algumas raras excepções - políticas paliativas, inibidoras da capacidade dos nossos governantes em implementar uma verdadeira política orientada para o investimento, aquela que daria solução à maior parte dos nossos problemas, à semelhança da nossa vizinha Espanha que, com a grande ajuda dos portugueses, possui hoje um saldo orçamental positivo de 0,4 % do seu PIB, enquanto que Portugal para não ultrapassar o déficit orçamental de 3,4 %, teve que recorrer à engenharia financeira das receitas extraordinárias!
Portugal possui uma mais valia inutilizada que é a relação histórica e de sangue que mantem com os PALOP, que apesar de pobres se encontram em vias de desenvolvimento, e que apesar de pobres, subsistem. Donde vêm os produtos que eles consomem? Quem lhes assegura o apoio em matéria de infra-estruturas? Porque não envolver directamente os seus governantes nos nossos projectos de investimento, no sentido de reerguer e dinamizar a nossa indústria, tendo à partida assegurado os mercados para o escoamento dos seus produtos?
Por último, uma breve nota sobre a questão do aumento dos salários dos funcionários públicos. A exigência de aumentos salariais com base em percentagens completamente irrealistas, mais do que nunca traduz o desrespeito dos senhores funcionários públicos pelo meio milhão de desempregados que sobrevive com meia dúzia de patacos, e por aqueles que se encontram em vias de ficar desempregados, uma vez que os seus empregadores não são o Estado, mas sim entidades vulneráveis à crise que é mundial, resultante das inevitáveis políticas da globalização.
São os senhores funcionários públicos que ficam retidos em Varadero e noutras paragens por causa dos furacões, são os senhores funcionários públicos que não dispensam 15 dias de férias no Algarve e são os senhores funcionários públicos que beneficiam de um sistema de saúde diferenciado e de múltiplas taxas de desconto quer na aquisição de bens de consumo, quer na prestação de serviços.
Fernanda Valente

publicado por quadratura do círculo às 12:26
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Aníbal Mendes - Parabéns pelo debate

O (último) debate pautou-se pelo carregar um fardo pesado por parte de Lobo Xavier. Foi muito penoso para o único apoiante do governo.
É lógico que estamos a perder altitude, com a macacada da abertura das Escolas, o encerramento da Refinaria...
Há aqui um aspecto importante: os atacantes de Santana já lhe conhecem os pontos fracos e ele vai no jogo, porque não consegue fugir...
Só espero que o País não fique feito num frangalho nos dois anos que lhe restam como 1º ministro, que eu espero que seja menos, com um crise politica e eleições antecipadas.
Aníbal Mendes
publicado por quadratura do círculo às 12:23
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Terça-feira, 28 de Setembro de 2004

Edmundo Rocha - Sistema fiscal

O sistema fiscal foi construído com vários níveis de taxas destinados a onerar mais os que mais podem, certamente porque o legislador quis utilizar um critério de justiça social.
Ao longo do tempo, porém, têm sido criados benefícios fiscais com base em motivações económicas ou outras (incrementar a poupança, ajudar clubes de futebol, apoiar a compra de habitação, etc.), que têm distorcido completamente o critério de justiça social que deveria presidir ao sistema.
Um exemplo disso é o caso, que já referi em blog anterior, dos PPR e dos PPA que reduzem substancialmente a tributação dos que têm capacidade para poupar e investir.
Os que não tem essa capacidade ou não têm idade para o fazer (idosos) são penalizados por isso.
Isto é, ser pobre ou ser velho paga imposto....
Actualmente, o Fisco é um pequeno monstro.
Em nosso entender, a única forma de o purificar é expurgá-lo de todas essas deduções com objectivos económicos e não sociais.
De todas.
De uma vez.
Os desequilíbrios (em algumas famílias) resultantes dessa medida poderiam, se necessário, ser minimizados, durante um período transitório, com subsídios de tendência decrescente inscritos no Orçamento do Estado (fora do sistema fiscal) em rubricas adequadas e transparentes.
O sistema fiscal tem de ser simples e claro.
A manta de retalhos em que se transformou permite camuflar os privilégios de alguns, o que revolta os contribuintes que suportam o sistema e a ele não podem fugir.
Por outro lado, essas medidas aumentariam de forma significativa as receitas fiscais, sem aumentar as respectivas taxas.
Edmundo Rocha
publicado por quadratura do círculo às 19:54
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Fernanda Valente - Mudança necessária

Alguma coisa tem que mudar no universo da política portuguesa. Por muita vontade que alguns dos actuais ministros tenham em alterar o estado de coisas, carecem de uma liderança forte, que lhes defina as linhas de orientação, lhes asssegure o back up necessário, de uma forma presencial e a tempo inteiro. Num regime democrático é fundamental o debate entre as várias facções políticas com assento parlamentar. O executivo, encabeçado pelo seu 1º ministro, tem o dever de esclarecer os deputados - legítimos representantes do povo - em sede própria, sobre as políticas levadas a cabo e sempre que a isso seja questionado.
A eleição de José Sócrates para secretário-geral do Partido Socialista é uma lufada de ar fresco no panorama político actual; todos aqueles que se opuseram à indigitação de Santana Lopes para 1º ministro, e que estão agora a sofrer, directa ou indirectamente as consequências desse acto, esperam, a partir de agora, atenção redobrada a esta política de polichinelo, clientelar e dissociabilizante, ministrada pelo actual executivo.
José Sócrates tem um trabalho árduo pela frente se quiser ganhar as próximas eleições legislativas. O debate interno ao qual foi "forçado" a participar por parte dos dois candidatos seus adversários, ajudou-o a melhor se revelar perante a opinião pública e os decisores de opinião inicialmente cépticos quanto à sua escolha.
Fernanda Valente
publicado por quadratura do círculo às 19:50
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Luís Leonardo - Ensino, um sistema Monstruoso

Desde o 25 de Abril que se começou a construir o mostro. Na construção do dito monstro (s. m. - do Lat. Monstru - 1. Ser organizado, animal ou vegetal que apresenta conformação muito diferente da que é natural na sua espécie; 2. Animal ou coisa de grandeza desmesurada ... ) participaram, de maneira vária e contributo diverso, os Governos da Nação, os Partidos - os do governo e da oposição - Associações de Pais, Sindicatos de Professores, Universidades - Públicas, Privadas e Cooperativas -, Conselho Nacional de Educação, enfim, figuras singulares de respeitável saber. Aos professores coube realizar o que todos os outros sonharam e cuja essência se encontra na (com)sagrada Lei de Bases do Sistema de Ensino de 1986: educar a todos, em todos os lugares, segundo os mesmos princípios, durante igual período de tempo.
Aquilo que se quis fazer foi um sistema. Porém, os arquitectos eram vários,
foram(-se) mudando e aquilo que hoje um programava, o outro desprogramava; aparecia um e acrescentava mais uma disciplina; depois vinha outro e acrescentava uma área; acharam todos que o melhor era alterar todos os programas e aumentá-los a todos. De um modo ou de outro todos quiseram deixar a sua marca.
A prova de que se trata de um mostro que cada novo ministro da Educação continua a alimentar e aumentar é a barafunda das listas de colocação dos
professores: já nem os computadores naquilo que no monstro é computacional conseguem ordenar. Lá está: é que o monstro por definição não é ordenado, tem excrecências, é desproporcionado ... é caótico. É preciso dizer que qualquer outra parte (se é que há partes num caos!) do monsto o resultado é o mesmo, só que como não é de ordem computacional e não exige que para uma parte para bater certo todas as outras batam certo também e como ninguém sofre particular e concretamente com isso ou não se dá conta ou não se reclama.
O monstro é tão ingovernável que quando se trata de constituir governo para a nação, nunca ninguém se importa com as competências ou perfil do escolhido para governar o monstro e os escolhidos porque sabem que o monstro é ingovernável também não se intimidam, nem se importam. Como tanto faz, David Justino aceitou que por imperativos de arranjos coligacionais lhe pusessem um secretário com quem, ao que dizem, não falava, e uma secretária que quando falava não cometia lapsos, como muitos diziam, mas traduzia o que genuinamente pensava, sendo aquilo que pensava pôr em prática inconstitucional. Os resultados desta bela equipa estão à vista.
O que será preciso ainda acontecer mais para se darem conta do monstro?
Que há 50 ou 100 mil professores que não estão satisfeitos com o local de trabalho e por isso querem mudar de escola?
Que de repente, uma grande parte dos professores descobriu que tinham doenças perigosas, gravidezes de risco, menores para tratar, ascendentes dependentes dos seus cuidados, deficiências ... e sei lá que mais?
Que há cerca de 30 mil professores que depois de tudo isto vão ficar desempregados (trata-se pe pessoas que estudaram cinco anos na Universidade e que fizeram um estágio profissional...)?
Que os professores que não conseguem estar nas escolas para que concorreram, muitos deles, dado o vencimento auferido, não podem instalar-se num hotel, não podem alugar um apartamento e têm de se contentar, quantas vezes com um quarto; que os professores deslocados um ano numa escola, esperam que o tempo passe depressa e dão tantas faltas quantas podem para ver se o dinheiro que lhe dão dá para sustentar o vínculo ao emprego e à esperança de dias melhores; que os professores deslocados não podem contruir as suas vidas nem ajudar a construir as dos seus alunos; que por tudo isto (e não só) os professores trabalham mal e os seus alunos têm insucessos assustadores; que o Estado paga a todos os professores por igual trabalhem muito ou pouco, trabalhem bem ou trabalhem mal; que não lhes pode pagar de modo diferenciado porque a avaliação que faz do seu desempenho é uma farsa que pretendeu substituir o sistema anterior de progressão na carreira por antiguidade; que ninguém quer avaliar ninguém porque os avaliadores teriam também de ser avaliados; que ninguém sabe (se sabe não diz) quanto custa um aluno em cada escola - vai longa a ladaínha e não chegou a meio.
Se não dermos luta ao monstro, devorar-nos-á implacavelmente.
Luís Leonardo
publicado por quadratura do círculo às 19:43
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Paulo Correia - Ainda a escola

Parece nos tempos que correm que a "distribuição de professores" é a principal obrigação do ministério da educação.
A meu ver estamos perante o reflexo de um erro que a nossa sociedade criou nos ultimos anos.
Entendo que a principal obrigação do poder instituído (conceito mais abrangente que o poder político) é a educação dos nossos jovens.
Os actuais alunos do nosso sistema de ensino, enquanto cidadãos de pleno direito e principalmente tratando-se da futura "mole social" que terá como principal referência o passado histórico que iremos deixar, merecem sem dúvida o melhor de nós próprios.
E não tenho tembem dúvidas de que, quando pertencerem à faixa etária dos "cotas" de hoje, virão a orgulhar-se de nós assim como nós, mesmo os que fomos irreverentes, acusadores e até insultuosos para com os nossos "velhos" nos orgulhamos hoje do passado recente e somos os maiores defensores do legado que nos deixaram, procurando até justificar os erros cometidos com o "enquadramento socio-cultural da altura".
Recai assim sobre todos nós, pais, professores, dirigentes e dirigidos, políticos do poder e da oposição e mesmo sobre quem não têm filhos a enorme responsabilidade egoísta de perpetuarmos a nossa sociedade.
Suponho que toda a focagem do sistema de educação deveria ser sobre o educando mas tenho a convicta opinião de que neste momento se caiu num pântano lodoso em que os direitos justamente adquiridos pelos professores, a manutenção das necessárias hierarquias funcionais, a indispensável edição de livros escolares, a democrática orientação política do sistema e até a importantíssima divulgação publica das situações se tornaram na verdadeira razão de ser de tantos erros acumulados.
Continuo sem compreender, mas após tanto tempo de antena deve ser por alguma deficiência mental, como é possível no Portugal do terceiro milénio as escolas não terem equipas docentes estáveis, o preço dos livros escolares ultrapassar o ordenado mínimo nacional, os professores acusarem as famílias de falta de educação em casa, os pais acharem que os professores estão desmotivados, os ministros pensarem sempre fazer melhor que os anteriores.
Finalmente acho que os estudantes devem ser unicos que têm razão quando afirmam à boca cheia que é uma m... a escola mas o pessoal é fixe. Nós tivemos porventura menos razão quando dissémos o mesmo.
Paulo Correia (aluno rebelde da década de 70 do século passado)
publicado por quadratura do círculo às 19:30
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Aníbal Mendes - Trapalhada na Educação

Não sei o que originou toda esta situação. O que eu vejo é que provávelmente este é só mias um caso da dita empresarialização de funções do Estado ( isto é menos Estado e melhor Estado). Isto porque um dos intervenientes foi uma empresa que nada tem a ver com o Estado (a Compta), mas que estava a executar uma função de um Organismo Público, empresa que já falhou por duas vezes, empresa que está recheada de gente do PSD etc...etc... e assim temos menos estado e pior Estado.
Tem-se assistido ao ataque deliberado aos funcionários públicos, este se for assim provado que a empresa privada falhou e prejudicou centenas de milhares de pessoas neste país, entre pais e filhos. Terá que óbviamente ter custos.
Mas é assim: os organismos publicos adjudicam serviços a empresas que não tem a camisola da casa, jogam com o lucro e deixam quase sempre porcaria - obras mal feitas etc.
Eis a grande trapalhada. Continuo a advogar que o que é do domínio publico deve ser gerido com todas as técnicas de gestão de Recursos Humanos, todas...
Até lá destruam-se os funcionários publicos e vivam as empresas dos ex-politicos nas instituiçoes publicas.
Aníbal Mendes
publicado por quadratura do círculo às 19:25
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Paulo Guinote - Estado da Educação

É difícil descrever o que qualquer cidadão normal minimamente responsável, mesmo que não seja professor, sente ao perceber o completo desvario em que entrou a governação em Portugal.
Após o descalabro em que se tornou a nossa Justiça e o labirinto em que se transformou a Saúde, a Educação contribui agora com a sua quota-parte para a sensação de completo desnorte em que o País mergulhou irremediavelmente.
Para quem é professor há quase duas décadas como eu e, entre aluno, professor e (mais recentemente) investigador na área da História da Educação, está embrenhado no sistema educativo português há quase 35 anos é particularmente triste verificar o estado de regressão a que fomos conduzidos nos últimos dois anos e a irresponsabilidade que assentou arraiais numa área que se proclama estratégica para o desenvolvimento (económico, social, cultural) do nosso país.
Em nome de algumas causas a que, em tese, todos podemos aderir sem grandes dramas - unificação absoluta do concurso para provimento de lugares nas escolas, com regras que (mesmo se discutíveis, de acordo com os diferentes interesses dos docentes) se apresentavam como claras - a anterior equipa do Ministério da Educação decidiu mexer no enquadramento legal e nos instrumentos técnicos do concurso de professores para os Ensinos Básico e Secundário.
Como acima escrevi, a legislação, mesmo se susceptível de desacordo, parecia clara; para garantir a uniformidade da aplicação dos critérios e - pensava-se, então - para acelerar e facilitar todo o processo decidiu optar-se pela aquisição (fora do Ministério) e aplicação (no Ministério, fora do Ministério ?) de um programa informático para tratar toda a informação necessária.
A articulação entre os princípios que norteavam a teoria (legislação) e a prática (programa informático) foi nula ou, se o não foi, foi muito deficiente. O que se seguiu já todos conhecemos nos seus aspectos mais visíveis para o público e não é necessário fazer-lhes a infeliz história.
Os equívocos que se acumularam ao longo do processo foram muitos e, mais imprtante, foram reveladores de grave indiferença, incompetência ou mesmo desconhecimento de aspectos basilares do problema: esqueceu-se o complexo emaranhado das qualificações profissionais dos docentes, não se testou o programa em tempo útil, antes dos concursos, com recurso a amostras de casos reais ou a exemplos fictícios, substituiu-se (a destempo) a equipa política do Ministério responsável pelo início da catástrofe e, por fim, nomeou-se novo pessoal com experiência mais do que escassa na área, soprou-se um pouco, e esperou-se que o fogo ateasse.
É impensável arvorar a Educação como área estruturante do progresso da sociedade portuguesa e como lugar-comum recorrente do discurso político quando se fala da necessidade de recuperar o atraso português em relação à Europa, se é assim que se trata o maior contingente profissional com habilitações de nível superior que existe no país.
É absolutamente demagógico dissertar sobre a necessidade da Escola ser atractiva, apelativa, estimulante, etc, etc, para os alunos que a frequentam, se assim se tratam os docentes que a fazem funcionar e são indispensáveis para lhe darem qualidade.
É atrozmente irresponsável tratar dezenas de milhar de docentes como se fossem carne para canhão e uma massa amorfa de autómatos descaracterizados, disponíveis para qualquer abuso que sobre eles(as) o acaso e a cegueira (técnica e política) fazem cair.
É verdade que a própria classe docente é, em boa parte, responsável pela degradação a que a sua posição social e a sua dignidade profissional chegaram pois as suas associações representativas (leia-se, sindicatos) optaram pela via da fragmentação feudal ou pelo predomínio da reivindicação salarial sobre todas as outras, permitindo a progressiva proletarização daqueles que representam. Todos os anos lá temos as duas greves da praxe, em troca de 0,5% no salário, numa coreografia bem ensaiada com o Ministério e levada ao palco há décadas com um sucesso cada vez mais duvidoso e com efeitos cada vez mais desmobilizadores.
De forma subreptícia, assumiu-se que a Educação é, no caso dos docentes, o refúgio dos licenciados menos empreendedores na sua área científica e, para os alunos, um período de vida cada vez mais alongado destinado a obter credenciais académicas com o máximo de fruição e a menor dose de esforço e empenho.
É triste, mas é verdade e, pior do que isso, corresponde cada vez mais a uma realidade contra a qual cada vez menos de nós lutam.
A situação que se vive na Educação nos dias que passam é de completa calamidade e, num momento em que a população discente está estabilizada, o presente atraso nos concursos dos docentes seria absolutamente incompreensível se não soubessemos todos, mais ou menos a contra-gosto, de forma mais ou menos explícita, que a nossa governação caiu num dos pontos mais fundos de que há memória, em termos de visão política e competência técnica.
Para mim, chegámos ao fundo do poço, à decadência de qualquer ideia válida da Educação e ao fim do Docente como profissional reconhecido na Sociedade.
Resta-nos saber se, numa perspectiva optimista, a partir daqui só podemos melhorar ou se, numa perspectiva pessimista, aqui nos iremos aconchegar e deixar ficar.
Inclino-me para esta última hiótese, pois o nosso pessoal político é menoríssimo e, em virtude dos muitos desvarios pedagógicos na Educação, o pessoal técnico cada vez menos competente. E a tendência não é para melhorar, muito pelo contrário.
Restava-nos até agora a sacramental e tão criticada burocracia que, apesar da falta de imaginação, rotina, redundância e morosidade, ainda ia assegurando os serviços mínimos da Nação.
Ao que parece, agora já nem isso nos resta.
Paulo Guinote
publicado por quadratura do círculo às 19:18
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Carlos Frota - Competência da Ministra da Educação

Neste reencontro depois de férias, demasiadamente vivo para o meu gosto (quando todos falam ao mesmo tempo, não é fácil seguir linhas de raciocínio), aconteceu ser levantado um problema interessante, até porque é infelizmente transversal a quase todos os governos, independentemente da sua cor partidária. No caso concreto actual, a pergunta é: “Será Maria do Carmo Seabra (MCS) competente para Ministra da Educação?” Lobo Xavier (LX) disse que sim, porque é uma mulher inteligente. Pacheco Pereira (PP) não contesta a inteligência da professora catedrática, mas argumenta que não fazia mal nenhum se ela tivesse um pouco mais de background de educação… Ora bem, eu estou de acordo com os dois (embora rara vezes isso aconteça…). Um ministro tem efectivamente de ser uma pessoa inteligente e – acrescento – tem de ter bom senso. Mas não basta, ele tem (neste caso, ela tem) de ter um conhecimento razoável da área de governo que lhe está entregue. Repare-se que digo razoável, não digo excelente. Duvido, com PP, que Maria do Carmo Seabra tenha da educação mais conhecimento do que tem uma qualquer pessoa com filhos, que estudou em escolas em passado distante. Ora se um(a) ministro(a) inteligente quiser contornar o problema das sua falta de conhecimento das matérias sobre as quais tem de decidir, pode fazer o que é comum: rodear-se de assessores, consultores, enfim, gente que saiba do ofício. Não sei se MCS o fez, mas sinceramente duvido que um bom assessor a tenha aconselhado a proceder como procedeu quando, depois dos acontecimentos passados, veio anunciar como definitiva uma data para a publicação das célebres listas.
Aliás, tendo em atenção os hábitos do passado, não é difícil pensar que os assessores sejam escolhidos não pela sua competência técnica mas por outros motivos – clientelismo, amizade, enfim, sabe-se como é.
O que mais lamento, porém, é que nesta altura poucas pessoas vão à origem deste caso, que remonta ao nefasto período de David Justino - Abílio Morgado no Ministério. Eu sei que PP tinha (não sei se continua a ter) David Justino em grande conta. Lamento, mas para mim David Justino foi o pior de todos os Ministros da Educação que conheci. Porquê, se inegavelmente era (é) uma pessoa inteligente? Precisamente porque não teve bom senso, porque embarcou na ideia de que lhe bastava seguir o “senso comum” (que não é o mesmo que bom senso…), concretizar o que ele pensava, sem se dar ao trabalho de equacionar todas as variáveis que em cada caso estavam em jogo. Arrogante desde o começo, a rotular de incompetentes os que lhe tinham antecedido – e, por favor, seriam assim tão incompetentes Marçal Grilo, Ana Benavente, Santos Silva, Oliveira Martins? – destruiu serviços de qualidade (o caso do Instituto de Inovação Educacional é uma nódoa), parou processos que estavam a dar resultados excelentes (caso do INAFOPE) e paralisou os serviços centrais com uma reforma do Ministério que não vai poder manter-se quando alguém que perceba de educação chegar à 5 de Outubro (ou à 24 de Julho, se entretanto o Ministério mudar de casa…).
Ora se o sistema dos mini-concursos era indesejado por todos, decidir um sistema centralizador como o que se adoptou era um risco muito grande, dada a quantidade de professores envolvidos e as muitas variáveis a ter em conta. Não sabemos ao certo o que aconteceu, mas não me admira se um dia se vier a provar que alertas dos serviços sobre o previsível fracasso tenham sido descartados por parte do Secretário de Estado.
A educação é uma área complexa e sui- eneris, em que todos pensam que podem ser definitivos nas suas ideias, um pouco como os treinadores de bancada no futebol… Gerir a educação é porventura o maior desafio para um político. Qualquer decisão afecta o sistema como um todo, e o sistema é tão grande como o País, mexe com a quase totalidade da população porque será rara a família que em qualquer momento da sua vida não tem alguém ligado à escola. Repare-se como uma decisão mais ou menos burocrática – colocar professores – levantou um vendaval.
Em resumo: precisa-se de um Ministro ou Ministra da Educação inteligente, com bom senso e preferencialmente com conhecimento directo na área (não fazia mal nenhum se tivesse uma formação avançada em Educação, apesar do descrédito que alguns têm procurado lançar sobre quem tem formação superior na área), que seja capaz de dialogar com todas as forças representativas (políticas e científicas), que acredite que apesar de serem legítimas orientações políticas diferentes há grandes princípios e verdades irrefutáveis que estão acima das opções partidárias. Um Ministro ou Ministra que, ao ser entrevistada na televisão, mostre que saiba do que está a falar…
Carlos Frota

publicado por quadratura do círculo às 19:11
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