Quinta-feira, 23 de Março de 2006
Não admira que os índices de abstenção em eleições sejam sempre bastante elevados. Lisura e transparência não têm sido as notas dominantes no diálogo entre os políticos e os cidadãos. O actual Presidente da República, ao ter enunciado a sua candidatura como suprapartidária, deixou cair por terra algumas dúvidas que ainda subsistiam quanto ao seu envolvimento emocional com o partido social-democrata, e cuja presença se torna agora evidente através das disposições que tomou quanto à nomeação da sua competência, dos cinco cidadãos a conselheiros de Estado, todos eles políticos, todos eles conotados ideológica e/ou partidariamente com o PSD. Para trás, esquecidos, ficaram a sociedade civil, o mundo das letras e das artes e aquela minoria representativa de 7,57 % da população portuguesa que acrescida de uma outra minoria de número aproximado, preenchem o total de 22 deputados na Assembleia da República, vezes uns largos milhares de cidadãos eleitores que não votaram PS, muito menos PSD e decididamente não CDS/PP que, por acaso, e de uma forma inaudita irá ter voz activa no dito órgão político que é o Conselho de Estado.
É claro que estas minorias partidárias não pouparam elogios à candidatura presidencial ganhadora aquando da campanha eleitoral, apesar de terem observado, de uma forma regrada, os preceitos protocolares da tomada de posse. No entanto, um Presidente que se avoca de todos os portugueses, deveria de uma forma exemplar, seguir a via da indulgência, como convem ao mais alto magistrado da Nação, mesmo porque estamos na presença de um extracto social com algum peso no tecido produtivo do nosso país, suportado por um dos sectores mais sensíveis desse espectro laboral , o sindical, sendo, pois, de toda a conveniência evitar fustigar essa classe que mais directamente se encontra sujeita às consequências resultantes da precariedade do emprego, sob pena de a cooperação estratégica com o Governo anunciada pelo Presidente dar lugar a um ensaio fracturante de governance entre estes dois órgãos de soberania.
Fernanda Valente